DESCENDIMENTO TEMÁTICA Pertence a uma série de quadros cujo elo comum é o tema da Paixão de Cristo. O conjunto foi realizado na década de trinta. Não é fruto da própria iniciativa do mestre. Sua execução se deve à encomenda de um personagem relevante dentro da política holandesa. Trata-se do Príncipe Federico Henrique, membro da Casa de Orange. A tela recolhe o instante dramático em que Cristo é descido da Cruz. A cena pertence à iconografia religiosa tradicional. Um ancião vestido à maneira oriental contempla o assunto, que discorre num ambiente noturno e misterioso. Trata-se de José de Arimatéia. Maria é sustentada por outra mulher na penumbra de uma das esquinas do quadro, enquanto vários anciãos contemplam a trabalhosa tarefa. A composição tem notável afinidade com o tratamento que oferece uma obra de Rubens. O motivo escolhido também é similar. É muito provável que Rembrandt tivesse conhecimento daquele quadro através de uma gravura realizada por Vorsteman. A monumentalidade escultórica escolhida por Rubens é substituída pela tensão dramática e pela emoção interior. ANÁLISE TÉCNICA E ESTILÍSTICA A crítica é unânime na hora de destacar a relação existente entre este quadro e seu homônimo realizado por Rubens. Apesar da similitude entre ambos, a composição de Rembrandt incorpora notáveis variações. A primeira delas consiste em desfazer o grupo compacto de figuras de seu colega. Essa massa dinâmica se fragmenta. As santas mulheres se separam do grupo principal. Ficam na penumbra, ressaltando o protagonismo da figura de Cristo. A anatomia deste não parece atlética. Seu tratamento corresponde ao de um corpo sem vida que se deforma. A idealização abre passagem para o naturalismo a fim de conseguir maior sensação de tragédia e verossimilhança. Quanto à estrutura da composição, é de se destacar o equilíbrio que o esquema triangular do grupo principal oferece. Centrado no espaço da tela, ele não se situa em primeiro plano. Este é ocupado pela atmosfera, em penumbra, que envolve o motivo protagonista. Sobre a escuridão dominante emprega-se uma tonalidade fria. Azuis e amarelos realçam o contraste que supõe a brancura da mortalha. A iluminação enfatiza o drama da cena, mas também lhe confere uma sensação de misteriosa intimidade. INTERPRETAÇÃO Não se trata do único quadro no qual Rembrandt expõe este motivo cristão. O artista retoma o assunto em 1634, um ano depois. Também se conserva uma água-forte sobre o mesmo tema, embora sua composição seja bem diferente. Em todas estas representações, se combina o religioso com um dramatismo bastante acentuado. O exemplo que nos ocupa evidencia uma grande dose de teatralidade. Este traço é muito típico da estética barroca. O sentimento religioso aparece sublimado nesta composição, graças ao tratamento da luz. Cavavaggio havia aberto caminho às extraordinárias possibilidades que oferecia o jogo contrastado de luzes e sombras. O mestre holandês retoma a experiência artística do italiano. O claro-escuro se torna uma ferramenta muito útil na hora de imprimir emoção a este quadro. Embora, neste caso, a irrupção da luz perca um pouco de violência. Aprecia-se uma sutil transição da escuridão à claridade mediante a aplicação de cinzas e marrons. Este procedimento suaviza uma possível impressão traumática, criando também uma atmosfera envolvente. Do resultado final transcende uma visão emotiva e pessoal do religioso.